domingo, outubro 30, 2011

Conhecendo as tradições do Povo Judeu

O que é o Kadish?

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O Kadish é um hino de louvor a D’us. Por ser tradicionalmente recitado nos enterros e nos serviços comemorativos dos finados, ele é popularmente considerado como uma oração pelos mortos. Entretanto, o Kadish não faz nenhuma referência à morte ou ao luto. É puramente uma exaltação a D’us e uma súplica por um mundo de paz.

Embora os cabalistas do século XVI atribuíssem um caráter místico ao Kadish, alegando que toda vez que ele era recitado, a alma do falecido se elevava a um nível espiritual mais alto, o valor intrínseco do Kadish se relaciona a pessoa que o recita. Há uma expressão pública de fé em D’us por parte do enlutado, uma aceitação da Sua vontade mesmo em face da dor e da tristeza, uma submissão aos desígnios divinos diante da incapacidade de racionalizar uma tragédia pessoal.

O Kadish tem sido um dos fatores predominantes da continuidade do povo judeu - um elemento essencial daquele cordão umbilical que vem ligando às gerações judaicas uma à outra através dos tempos.

Como Lidar Com o Luto?

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É natural perguntar-se “Por quê?” num momento de angústia. Uma resposta geral, que é realmente óbvia, mas difícil de aceitar num estado de sofrimento emocional, é que não é lógico limitar o Criador em Seus desígnios e ações para que estes se conformem ao entendimento de um ser humano criado.

Para citar uma ilustração simples: não se pode esperar que uma criança pequena entendesse as ideias e ações de um professor erudito, embora este tenha sido criança um dia, e a criança de hoje tenha o potencial de sobrepujar o professor no devido tempo. Quanto mais, então, quando se trata da infinita inteligência do Criador face a face com a inteligência finita e limitada de um ser humano.

A diferença entre um ser humano criado e seu Criador é absoluta. Nossos Sábios declaram que um ser humano deve aceitar tudo que acontece, tanto as boas ocorrências quanto aquelas incompreensíveis, com a mesma atitude positiva que “tudo que D’us faz é para o bem”, embora esteja além do entendimento humano.

Esta não é uma revelação tão grande assim, mas, como diz a Toráh, é difícil para uma pessoa aceitar consolo num momento de luto.

Apesar disso, D’us tornou possível aos seres humanos entender alguns aspectos sobre a vida e o pós-vida. Uma dessas verdades reveladas é que a Neshamáh (alma) é uma parte da Divindade, e é imortal. Quando chega a hora de ela voltar ao Céu, deixa o corpo e continua sua vida eterna no Mundo da Verdade espiritual.

É também uma questão de bom senso que aquilo que provoca a separação da alma e do corpo (seja um acidente fatal, doença, etc.) pode afetar somente os órgãos vitais do corpo físico, mas não, de maneira alguma, a alma espiritual.

Outro ponto, também compreensível, é que durante a vida da alma na terra em parceria com o corpo, a alma está “incapacitada”, em alguns aspectos, pelas exigências do corpo (como comer e beber). Até um tsadik (pessoa justa) cuja vida toda é consagrada a D’us, não pode escapar das restrições da vida num ambiente material e físico.

Consequentemente, quando chega a hora de a alma voltar “para casa”, isto é basicamente uma libertação para ela, que faz a sua subida a um mundo mais elevado, não estando mais restrita por um corpo e ambiente físico. A partir de então, a alma está livre para desfrutar a felicidade espiritual da proximidade com D’us de maneira completa. Este certamente é um pensamento reconfortante.

Alguém poderia perguntar: Se é uma libertação para a alma, porque a Toráh prescreve períodos de luto? Não há uma contradição aqui. A Toráh reconhece os sentimentos naturais de tristeza sentido pela perda de um ente próximo e querido, cuja morte deixa um vazio na família. A presença física e o contato com o ente querido serão sentidos profundamente. Portanto, a Toráh prescreve determinados períodos de luto para dar expressão a esses sentimentos, e para tornar mais fácil recuperar o próprio equilíbrio e ajustamento.

No entanto, entregar-se a estes sentimentos além dos limites estabelecidos pela Toráh – além de ser um desserviço a si mesmo e aos outros, bem como à Neshamáh – significaria que a pessoa está mais preocupada com os próprios sentimentos que com os sentimentos da Neshamáh que ascendeu a novas alturas espirituais de felicidade eterna. Assim, paradoxalmente, o prolongamento excessivo dos sentimentos de tristeza, devido ao grande amor pelo ente querido que partiu, na verdade causa sofrimento ao ente querido, pois a Neshamáh continua a interessar-se pelos parentes que ficaram para trás, vê o que está acontecendo (melhor ainda que antes) e se alegra com eles quando estão felizes, etc.
Embora a alma seja eterna e esteja agora num estado não restringido pelas limitações do corpo, está plenamente cônscia daquilo que acontece na família. Quando vê que é causa de tristeza e luto além dos limites do razoável estabelecidos pela Toráh, obviamente fica aborrecida e isso não contribui para a paz e felicidade da alma.

Mesmo durante a estada da alma nesta vida, o vínculo real entre a pessoa e os membros da família não são físicos, mas espirituais. O que faz a pessoa não é a sua carne, mas seu caráter e qualidades espirituais. Este vínculo permanece e todos aqueles que amaram a pessoa deveriam tentar levar mais gratificação e elevação espiritual à Neshamáh por meio de maior apego à Toráh em geral, e particularmente no âmbito relacionado com a partida da alma. Ou seja, observar aquilo que é prescrito para o período de Shiváh, mas não estendê-lo, e da mesma forma, com o período de Shloshim (trinta dias), mas não, além disso, e então servir a D’us por meio do cumprimento de Suas mitsvot como o serviço deveria ser – com alegria no coração.

A alma que se foi não pode mais cumprir mitsvot, pois isso é algo que somente pode ser feito em conjunto pela alma e pelo corpo neste mundo material. Mas isso, também, pode ser parcialmente superado quando aqueles que ficaram cumprem mitsvot e boas ações em homenagem, e em benefício, da Neshamáh que se foi.

Shiváh é um período de luto pela alma de um ente querido que retornou ao Mundo da Verdade. Uma alma judaica é descrita na Toráh como “a lamparina de D’us”, pois seu propósito nesta terra é divulgar a luz da Divindade. Sua partida desta terra é um motivo para o luto da maneira prescrita na Toráh. Porém, juntamente com isso, não se deve esquecer que a alma é eterna. Também não deve ser esquecido que até um evento triste vem de D’us, portanto não pode haver dúvida de que há nele um bom propósito.

Porém o objetivo essencial de Shiváh é que “os vivos devem refletir em seu coração” (Kohêlet 7:2). Isso significa que aqueles que ficaram para trás devem examinar seu coração e reavaliar-se. Devem tentar aperfeiçoar-se em áreas da vida diária que são reais e eternas – i.e., Toráh e mitsvot. Na verdade, como a alma que ascendeu ao Céu deixou uma lacuna de boas ações descontinuadas aqui na terra, os parentes e amigos devem fazer uma compensação por meio de esforços adicionais de sua parte.

A Vida Nunca Termina

Por Yitschak Meir Kagan

clip_image004[1]

clip_image007De uma carta do Rebe escrita a uma viúva de guerra em Israel

“E Iahacov terminou de ordenar aos filhos, e recolheu os pés na cama, e expirou, e foi reunido ao seu povo.” (Bereshit 49:33)

A Toráh não declara “ele morreu”, e os Sábios declararam “Nosso pai Iahacov não morreu… assim como seus filhos estão vivos, também ele está vivo.”

O que forma a base para o amor e a união entre dois amigos queridos, entre marido e mulher ou entre filhos e seus pais? Não o corpo físico, que é carne, osso e entranhas, mas as características do espírito, a verdadeira essência do homem. O que acontece é que o homem se comunica com seu semelhante através do corpo e seus membros. Através dos olhos, ouvidos, mãos, órgãos da fala, etc., o homem dá expressão aos seus pensamentos, sensações e as características de seu espírito e (obviamente) são eles, não as ferramentas corporais de expressão, que constituem sua verdadeira essência e seu ser.

Ocorre que no Mundo da verdade (a vida espiritual que se segue) a alma do falecido tem um grande prazer ao ver os membros da sua família se recuperarem da perda, se recomporem, e fazer todos os esforços para colocar a vida em ordem, e agir como uma inspiração e encorajamento aos outros.

Uma bala, um fragmento de concha ou uma doença podem danificar o corpo, mas não podem ferir ou afetar a alma. Podem causar a morte, mas a morte é apenas uma separação entre corpo e alma. A alma continua a viver (eternamente); continua a ter uma conexão com a família, especialmente com aqueles que foram especialmente queridos e amados. Compartilha seu desgosto, e se alegra com cada evento feliz na família. Ocorre apenas que os membros da família, vivendo neste mundo terreno, não podem ver a reação da alma com seus olhos de carne e sangue, nem pode tocá-la ou senti-la com as mãos – pois a conexão física foi rompida.

A alma daquele que partiu extrai especial satisfação ao ver seus filhos sendo criados no correto espírito de Toráh, livres de qualquer sentimento de desespero ou depressão, D'us não o permita, mas sim (como diz a expressão tradicional)… “criá-los para a Toráh, o casamento e boas ações."