domingo, outubro 16, 2011

Uma Historia para Meditar

Uma Historia para Meditar
Joias do Maguid 
JÓIAS DO MAGUID

O Maguid de Jerusalém, Rav Shalom Shvadron ZT"L, foi um dos maiores oradores da nossa geração. Possuidor de um dom singular para transmitir o doce sabor dos caminhos Judaicos, reuniu incontáveis platéias durante dezenas de anos.

Seu vultoso repertório de histórias verídicas é composto por incontestáveis pérolas do patrimônio Judaico, motivo de inspiração e encorajamento. Leia a seguir uma de suas jóias:

UM PEDIDO PARA TODA UMA VIDA

A vida é repleta de decisões. A cada dia, cada um de nós tem que tomar muitas delas. Algumas maiores, outras menores, mas cada decisão que tomamos deve ser a que estamos preparados para viver com ela.

Decisões requerem diferentes graus de pensamento, sabedoria e prudência. Algumas vezes, entretanto, a pessoa precisa tomar uma decisão que pode alterar o curso de sua vida para sempre. Pode não ter nem o luxo de haver tempo para consultar seus amigos ou familiares. Aí, então, a decisão particular que ele toma vem do fundo de seu coração, e revela seu interior e sua definição das prioridades da vida.

Neste incrível incidente relatado pelo Rabino Yisroel Grossman, juiz (dayán) em Jerusalém, sobre seu pai, o Rabino Zalman, aprendemos, através de uma difícil decisão tomada por ele, os valores de um extraordinário Judeu.

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O Rabino Zalman Grossman era um Judeu extremamente piedoso, em Jerusalém, que manifestava uma singular abordagem na observância do Shabat: do pôr-do-sol de Sexta feira à tarde, até o final da Havdalá, sábado à noite, ele não dormia.

Explicava este costume a seus filhos, dizendo: "O Talmud (Shabat 119a) refer e-se ao Shabat como uma bela rainha. Portanto, todo Judeu neste dia deve ser considerado como um rei, que tem a oportunidade de passar seu tempo com a rainha". Contava-lhes, então, uma parábola:

"Havia um rei que dormia muito pouco. O povo de seu reino lhe perguntava por que agia assim, e ele lhes respondia: ‘Quando durmo, sou como qualquer outro. Somente quando estou acordado e consciente de quem realmente sou, é que percebo que sou o Rei’. Portanto", R' Zalman continuava, "por que devo desperdiçar, ao dormir no Shabat, cada precioso momento desta maravilhosa oportunidade que tenho de passar com a Rainha Shabat ?"

R' Zalman passava todo o Shabat estudando mishnayót (textos da tradição oral), recitando os Salmos, cantando zemirót ou rezando com grande fervor. Mesmo sendo pobre, no Shabat. R' Zalman personificava a realeza.

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Em 1912, quando Israel (então chamado Palestina) estava sob domínio turco, a pobreza se espalhava por todo o país. As pessoas estavam literalmente morrendo de fome e havia poucas oportunidades de emprego. R' Zalman não tinha outra opção que não deixar Israel por alguns anos, ir para os EUA e arrumar alguma forma de viver, para poder retornar e sustentar sua família.

Solicitou um emprestimo de dinheiro para a passagem, subiu no navio e começou sua longa jornada pelo Mar Mediterrâneo e através do Oceano Atlântico.

Na primeira sexta-feira a bordo, R' Zalman decidiu se portar da mesma maneira que o fazia em terra: iria cumprir o Shabat da mesma forma que o fazia toda semana. Depois de rezar, cantou Shalom Aleichem, Ribono shel Olam, Éshet Chail, fez o Kidush (santificação do vinho, que se faz todas as sextas ferias) e comeu sua refeição de Shabat. Durante a refeição - que fez sozinho - cantou zemirót (musicas dedicadas a espiritualidade do Shabat) e examinou um dos muitos livros que trouxe consigo. Depois, sentou-se em um canto e começou a estudar Mishnayót(textos da tradição oral – Talmud).

O que não havia percebido é que, mais ou menos do meio de sua refeição, continuando até depois, quando estudava as mishnayót e a porção da semana, um homem estava em pé, de lado, observando-o. Por horas o homem observou, com surpresa, enquanto R' Zalman absorvia a beleza e o esplendor do Shabat. Finalmente, o homem foi dormir, mas R' Zalman permaneceu acordado toda a noite.

Pela manhã, o homem de novo observava a intensidade e a doçura das tefilót de R' Zalman. Assistiu como fazia o Kidush, cantava as zemirót novamente e comia sua refeição, completamente envolto na santidade do Shabat. Por toda a tarde e em Minchá(oração da tarde) e Seudá Shelishit (a terceira refeição de Shabat), o homem continuamente observava R' Zalman. Finalmente, depois da Havdalá (cerimonia da finalização do Shabat), o cavalheiro se dirigiu para onde R' Zalman estava.

Começou a falar com respeito e admiração: "Observei-o por horas durante o Shabat. Nunca em minha vida vi ninguém se envolver tanto com a beleza do Shabat como o senhor o fez. Mal consigo começar a lhe contar o quanto fiquei tocado por seu comportamento. Talvez o senhor não saiba quem eu sou, mas meu nome é Barão Rotschild".

R' Zalman estava verdadeiramente surpreso com as palavras deste homem e mais surpreso ainda, que havia sido observado durante todo o Shabat. Os dois homens iniciaram uma curta conversa sobre suas origens e experiências e, quanto mais o Barão conversava com R' Zalman, mais fascinado ficava com aquele homem. Então, de repente, o Barão fez uma declaração surpreendente: "R' Zalman, gostaria de honrar qualquer pedido que o senhor possa ter. Dar-lhe-ei 15 minutos para pensar e então informe-me o que posso fazer pelo senhor".

R' Zalman não podia acreditar nesta súbita mudança de sorte. Tudo que tinha a fazer agora era pedir ao Barão Rotschild uma substancial quantia de dinheiro e, então, poderia pegar o primeiro barco de volta para Israel, poupando-se da humilhação de recolher dinheiro para si e sua família.

R' Zalman voltou para sua cabina, para refetir sobre o assunto. Mas quanto mais pensava, mais lhe vinha à mente um apuro:

Dois dias antes de partir de Israel, o irmão de R' Zalman, R' Shlomo Levi, veio falar-lhe. R' Shlomo Levi era um dos fundadores de Mishmár HaYardên, um mosháv (povoado) no norte de Israel, perto da Síria. R' Shlomo explicou ao irmão que seu mosháv, bem como outros 2 moshavim - Rosh Piná e Yesód HaMaláh - estavam infestados por malária. Crianças e idosos estavam morrendo diariamente como resultado desta horrível doença, e jovens pais eram confinados em suas camas, não podendo trabalhar para sustentar suas famílias. A situação estava piorando a cada dia que passava. Simplesmente não havia medicamentos para todos. "Quando você for para a América", R' Shlomo lhe implorou, "por favor, não se esqueça destas crianças e dos idosos. Famílias estão sendo dizimadas porque não há dinheiro suficiente para os medicamentos. Cada dólar que você nos mandar ajudará a salvar vidas".

Agora, sentado sozinho em sua cabina, R' Zalman estava num terrível dilema. sua inclinação natural era tentar salvar sua própria família das garras da extrema pobreza e da fome -- mas, o que seria das centenas e centenas de pessoas naquelas comunidades no norte de Israel ? Após alguns minutos agonizantes, tomou sua posição e saiu ao encontro do Barão.

"Já decidiu o que gostaria de ter ?", perguntou o Barão. "Sim, senhor", respondeu R' Zalman. "Tenho um irmão que se relaciona com 3 comunidades no norte de Israel. A área está infestada pela malária, que está causando a morte de muitas crianças e seus pais. Se o senhor conseguir alguma forma de enviar médicos para estas comunidades e tratar os doentes, este seria o maior favor que faria por mim".

O Barão deu sua mão a R' Zalman, cumprimentou-o e disse-lhe que faria o máximo possível. O resto da viagem transcorreu sem novidades. R' Zalman finalmente chegou a Nova York e montou um escritório na parte sul de Manhatan, para poder recolher fundos para a Yeshivá Ohel Moshe, em Jerusalém.

Quatro meses após sua chegada, R' Zalman recebeu uma carta de seu irmão, R' Shlomo Levi. Após os cumprimentos preliminares, lia-se na carta: "Meu querido irmão Zalman, não sei como começar a descrever o que tem acontecido por aqui nas últimas semanas. De repente, do nada, como o maná que caía do céu, médicos e enfermeiras chegaram às nossas cidades, com caminhões repletos de medicamentos e suprimentos. Abriram 3 diferentes farmácias, distribuíram pílulas para os doentes, aplicaram injeções em quem precisava e prescreveram medicamentos. Quase imedatamente as pessoas pararam de morer. Pode-se ver a saúde das pessoas melhorando dia-a-dia. Um período de 24 horas transcorreu sem que houvesse nenhuma morte. Estamos todos muito gratos a Hashém por esta súbita mudança nos acontecimentos. Pela primeira vez, em semanas, as pessoas estão realmente sorrindo e esperançosas".

R' Zalman mal podia acreditar no que estava lendo. O Barão tinha realmente atendido seu pedido ! R' Zalman continuou lendo a carta: "Meu querido irmão, você não precisa se preocupar mais conosco, Hashém tomou conta da gente. Preocupe-se com seus próprios problemas e, possa você e os seus serem ajudados da forma que nós o fomos".

R' Zalman leu a carta uma segunda vez, absorvendo cada palavra. Quando acabou, colocou o rosto sobre as mãos e chorou. Ele tinha realizado um ato básico e definitivo de chéssed (bondade), pois ninguém em Mishmár HaYardên ou nos moshavim vizinhos imaginava que era ele o responsável pelas incontáveis vidas que foram salvas.

Anos depois, R' Zalman contaria a suas crianças: "Chorei por outro motivo, também. Chorei porque estava muito agradecido a Hashém por ter me dado forças para superar minha inclinação natural de salvar minha família primeiro. Precisei de bastante coragem para pensar nos outros naquele difícil período de minha vida. Que eu tivesse sido capaz de reunir tanta força e ver os frutos de minha ação, isto foi indescritível. Como tive tanta sorte de ser capaz de beneficiar, de alguma forma, as pessoas de Klál Israel!! ". E as pessoas nos moshavim nunca souberam porquê foram ajudadas !

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* Esta historia encontra-se em um livro chamado Joias do Maguid, editado pela Revista Nascente da Comunidade Mekor Haim de São Paulo.