O JUDEU GASPAR DE LEMOS, PRIMEIRO EXPLORADOR DO BRASIL
A importância que merece atribuir à participação de Gaspar de Lemos da expedição que descobriu o Brasil ressalta desde logo da circunstância de haver decorrido de uma ordem régia vazada em termos elogiosos, conforme refere Gaspar Correia nas “Lendas da Índia”:
“El Rei entregou ao Capitão-mor Gaspar da Gama (Gaspar de Lemos), o judeu, porque sabia falar muitas línguas, a que El Rei deu alvará de livre e fôrro de sua comédia em terra dez cruzados cada mês, muito lhe recomendando que oservisse com Pedro Alves Cabral, porque se bom serviço lhe fizesse, lhe faria muita mercê; e porque sabia as coisas da Índia, sempre bem aconselhasse ao Capitão-mor o que fizesse, porque este judeu tinha dado a El Rei muita informação das coisas da Índia mormente de Gôa”.
Divergindo embora os historiadores quanto à origem de Gaspar de Lemos e à sua vida até haver entrado em contato com os portugueses, a versão mais aceita é a que o dá como judeu nascido na Polônia, de onde foi expulso ou teve que fugir em 1450, quando criança, por não ter querido sua família converter-se ao cristianismo. Após uma longa peregrinação através da Itália, Terra Santa, Egito e vários outros países, teria resolvido permanecer em Gôa, na Índia, ali adquirindo prestígio e vindo a ocupar a função de capitão-mor de uma armada pertencente a um rico mouro na ilha de Arquediva.
Foi nessa ilha que Vasco da Gama, em 25 de setembro de 1498, ao regressar de uma viagem à Índia, conheceu Gaspar de Lemos, que se lhe apresentou a bordo como cristão e prisioneiro do poderoso Saboya, proprietário da ilha.
Não tendo conseguido burlar a perspicácia de Vasco da Gama, este depressa o forçou a confessar que tinha sob suas ordens quarenta navios com instruções de Saboya para, na primeira oportunidade, atacar a frota lusitana.
Paradoxalmente, o incidente acabou gerando uma sólida amizade de Vasco da Gama por Gaspar de Lemos, a quem levou consigo para Portugal, onde o apadrinhou no batismo, deu-lhe o seu nome - pelo que passou a chamar-se Gaspar da Gama - e apresentou-o ao rei, D. Manoel, que o fez pessoa grata na corte e o nomeou “cavalheiro de sua casa”.
Na falta de elementos informativos seguros sobre o real papel desempenhado por Gaspar da Gama no descobrimento do Brasil, há quem admita inclusive que, apoiado na sua enorme experiência de viagens marítimas, tivesse ele intencionalmente induzido Pedro Álvares Cabral a afastar-se da África por acreditar na existência de outras terras na direção oeste da vastidão dos mares.
Seja como for, e ainda que sem fundamento tais suposições avançadas, permanece fora de dúvida que Gaspar da Gama fez jus ao epíteto de “o primeiro explorador da terra”, que lhe dá Afrânio Peixoto, e mesmo ao de “co-descobridor do Brasil”, que lhe atribui Alexandre Von Humboldt.